A presidente do banco suíço UBS no Brasil, Sylvia Coutinho, avalia que o País tem todas as condições para assumir protagonismo mundial na questão das “finanças verdes”.

No momento em que aumentam as cobranças internacionais e dos próprios agentes econômicos por políticas ambientais sustentáveis, ela diz que o Brasil “tem os maiores ativos ambientais do planeta” e pode conseguir atrair investimentos externos se souber aproveitar essa oportunidade.

Continua apos a publicidades

 

País Tem Potencial Para Ser Líder Em Finanças Verdes 23 de fevereiro de 2020

Qual é a sua avaliação do cenário econômico do Brasil?

O Brasil está vivendo um ciclo meio clássico de recuperação econômica. Este ano, a princípio, seria o quarto ano de um período de dez anos de crescimento. Porque a gente tem uma visão que prevê dez anos de crescimento sustentado.

E esperamos que 2020 seja o primeiro ano, assim sendo desses primeiros quatro anos dessa retomada, em que a gente veja um crescimento um pouco mais robusto.

Apesar , ainda assim claro, dos impactos causados pelo coronavírus, que deve derrubar um pouco o crescimento. Embora a  gente estimava que o PIB deste ano seria na ordem de 2,5%. E estamos revendo para algo em torno de 2,1%.

Qual é a importância das reformas para essa recuperação?

Uma coisa que acho positiva quando a gente olha o Brasil é que é um dos poucos mercados que está encarando de frente as reformas necessárias. Embora sendo obviamente, a reforma da Previdência foi um marco importante.

Continua apos a publicidades

Então, você olha aí e tem uma série de mercados, incluindo desenvolvidos, que estão tendo de passar pelas mesmas difíceis reformas e que não estão conseguindo. O Brasil está aí, não só fazendo a sua lição de casa, como há a sinalização de que vai continuar fazendo.

Apesar de  nossa visão de um ciclo positivo de dez anos para frente também pressupõe, claro, que essas reformas sigam acontecendo. Com efeito o Brasil continua naquele famoso ranking do Doing Business (os melhores países para se fazer negócios) com um score bastante ruim.

E a gente espera que isso, ao longo desse período, contribua para melhorar significativamente a posição do País no ranking.

O governo está tentando reduzir a participação do Estado e assim sendo atrair o setor privado para os investimentos. Como a sra. vê isso?

O fechamento do PIB do ano passado, que será anunciado em março, está estimado em torno de 1,0%, 1,1%. Quando a gente olha o número resultante, não é tão robusto como esperaríamos.

Mas quando você desconstrói esse 1,0%, você teve o Estado recuando algo em torno de 0,6% e o setor privado crescendo 2,0%, o que resultou no 1,1% que veremos em março. A resultante pode ter sido menor do que desejava o mercado.

Mas, qualitativamente, é bastante saudável. E mais sustentável do que crescimentos anteriores, que foram muitas vezes artificialmente inflados por ações governamentais e consumo de curto prazo.

Continua apos a publicidades

O que mais tem chamado a atenção da senhora?

Outras ações que me animam bastante é o que está acontecendo no setor de infraestrutura, no agronegócio, que, além de serem pilotados embora por pessoas que realmente entendem do negócio, estão se reformulando para se tornarem cada vez mais competitivos globalmente.

O Banco Central também está com uma forte agenda para aumentar a competição. Eu diria que tudo isso está convergindo para um maior crescimento estrutural da economia.

A epidemia do coronavírus deve atrapalhar o crescimento?

O cenário externo até abriu o ano de maneira bastante benigna. Tirando o coronavírus e a situação no Oriente Médio, eu diria que o arrefecimento da guerra comercial entre China e Estados Unidos deu uma acalmada nos mercados, e a gente percebeu, paulatinamente, uma retomada no apetite pelos mercados emergentes. Especialmente quando se pensa que você tem lá fora os mercados desenvolvidos com taxas de juros baixíssimas e muitas vezes até negativas.

Os juros baixos facilitam para o Brasil?

Quando a gente pensa num dia a dia mais doméstico, em curto, médio e longo prazos, a taxa média dos juros no país Brasil nos últimos 20 anos foi de 13,1%. A gente espera que ela seja por volta de 5,5% nos próximos dez anos. Isso tem várias implicações.

Nunca vimos no mercado, por um período mais longo, juros baixos, inflação baixa. E a economia brasileira, tradicionalmente, é pouco alavancada. Seguimos a tradição de juros altíssimos ao longo de tantos anos.

Vamos pegar como exemplo o mercado do crédito imobiliário no Brasil. Temos aí um mercado com um potencial de alavancagem enorme, que ainda está na sua infância, até por conta dos instrumentos para fazer isso. Acho que ainda não vimos os efeitos de uma taxa de juros baixa por um período prolongado na economia brasileira no país. Isso também é um ponto bastante interessante.

Esses cenários que falei pressupõem que as reformas seguirão caminhando o país. A gente estima que vai haver, de alguma maneira, esse diálogo de maneira construtiva e que vão conseguir aprovar algumas dessas reformas importantes. Fora as propostas microeconômicas, que seguem caminhando também.

O ritmo das privatizações tem sido menor do que se esperava?

Essa não é uma agenda fácil. Acho que todos os agentes envolvidos estão caminhando no sentido de avançar de uma maneira bastante construtiva nessa agenda. Mas isso era esperado. Acho difícil julgar se poderia estar indo num ritmo muito mais rápido em função do contexto no qual elas se encontram.

No Fórum Econômico Mundial, em Davos, desde que o Brasil foi cobrado para ter melhores práticas ambientais. E ficou claro que uma política ambiental ruim poderá afastar investidores. Qual sua avaliação?

Em suma o Brasil, para mim, tem potencial para se tornar o líder mundial em finanças verdes. Temos os maiores ativos ambientais do planeta. Toda a nossa agenda de infraestrutura é verde. De fato  esse é o tipo de capital que temos condição de atrair. Então, essa agenda é muito importante. Existe hoje, globalmente, uma demanda tremenda de toda essa agenda de ESG, de investimento sustentável.